quinta-feira, 16 de novembro de 2006

Estado de Paz - 18

Obrigado por trazeres a vida a singularidade da tua presença. Dedico o tema deste artigo ao meu pai. “Viver para quê?”. “Qual o sentido da vida?”. As ainda eternas questões existenciais. Penso que tudo começou com Adão. O primeiro homem na Terra. Quando começaram os testes de vida no planeta, Adão veio inteirar-se se as condições eram já adequadas, Deus perguntou-lhe: “Adão, que estás aqui a fazer?”. Adão respondeu-lhe com no seu dialecto de primeiro homem: “Vim ver”. Estas poucas palavras, talvez devido ao seu diminuto e pouco desenvolvido dialecto, perpetuaram-se como “Vi(m)ver”, “ViVer”, “viver”. E assim começou a vida humana. Passado uns tempos, e já noutra fase existencial, talvez por enfado ou outra razão qualquer igualmente válida, alguém se questionou acerca da razão de existir, do sentido da vida. A este questionar da vida, chamou-se “Dú-vida”, “dúvida”. A perfeição está que na “dúvida” está a resposta a si própria. Por outro lado, e aproveitando a complexidade da linguística, “Du” pode ser entendido como pronome pessoal, “tu”. Então, questionar a vida é questionar-se. Porquê? Ora, dúvida, dú-vida, tu-vida. Se tu és a própria vida, és a resposta a ti mesmo(a), questionar a vida, é questionares-te a ti próprio(a), à tua existência. Por outro lado ainda, podemos dizer que viver é existir. Existir implica uma direcção e um sentido. O prefixo “ex” significa vindo de dentro, de dentro para fora. Então viver, existir, é manifestar fora quem se é dentro, ou se quisermos aprofundar, é ser transparente, e assim não preciso ser-se duas vezes, dentro e fora. Questionar a existência faz sentido quando fica turva a visão do “dentro” e quando se reflecte o “fora”, este parece que não se enquadra, não se alinha com algo que muitas vezes não sabemos explicar o que é. Mas ao adoptar esta linguagem do “dentro”, “fora”, do “ex” e “in”, corre-se o risco de permanecer na dualidade. Chamo-lhe risco, porque a resposta, ou melhor a necessidade da resposta só existe onde há dualidade. Na unidade não há mais dúvidas. Assim, para mim, questionar-se acerca do sentido da vida, é um simbolismo de procura da saída à pergunta. Se a pergunta faz na sentido apenas na dualidade, sair da pergunta é sair da dualidade. Sair da pergunta não é satisfazê-la com a resposta, por isso não lhe chamei responder mas sim “sair da pergunta”. Por exemplo, podemos questionar por que respiramos. Encontremos ou não uma resposta continuamos a realizar e a concretizar o propósito da respiração. Ou seja, ninguém fica sem respirar enquanto a resposta vem ou não. O processo é perfeito. Uma coisa é encontrar a resposta, outra é concretizá-la. Mas ao concretizá-la estamos já num outro estágio onde não faz sentido colocar a pergunta. Sendo concreto, se estamos em sintonia com algo, faz sentido perguntar por que não estamos em sintonia? É chegada a hora da sintonia. Basta para isso desligar os canais que nos distraem, todos os que deixámos que se nos impusessem, e outros que nos impusemos. São eles a tristeza, a mágoa, a infelicidade, etc. No fundo, não são outros canais. São apenas as interferências que nos turvam a visão do canal único, da unidade. Nós somos o canal e as partes unidas. Paz é capacidade de o reconhecer. A dúvida, a interrogação é um pedido entre duas entidades, “inter” – entre, “rogatio” – pedido. A dádiva transcende a necessidade do pedido. Dar-se é unir-se. Na união transcende-se a dualidade e a necessidade da dúvida. Paz é a união suprema de cada um consigo próprio.

M.A.S.

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