quinta-feira, 31 de maio de 2007

Estado de Paz - 30




Obrigado por seres quem és. A tua existência é um hino à perfeição e magnificência da vida. Tudo bate certo no mundo com a paz que trazes no coração.
Hoje falarei da Madeleine e de todas as Madeleine que conheço e sou. Por que se agitam tanto as pessoas quando situações como esta, e outras, envolvem crianças? Por que se identifica tanta gente com este caso, e outros, sempre que envolvem crianças? Por que se aceita toda a desgraça no mundo, mas sempre que se vê uma criança em sofrimento bate sempre tão fundo? Será que se deve a transportarmos essas imagens para as nossas crianças? Ou será por nos transportarmos até essas imagens? Por outras palavras, é o medo de que possa envolver quem está ao nosso lado (ente querido) ou é algo que nos envolve a nós, os nossos medos, e/ou experiências, e/ou memórias? A reposta correcta será sempre aquela da qual fugimos com maior pressa.
A Madeleine é muito mais do que um desaparecimento. Ela é uma projecção de por que é que ainda há razões pelas quais desaparecem crianças, a uma escala colectiva. E representa muito mais, para mim, do que um mero desaparecimento físico. Representa a inocência, a ternura, a candura, a infância, a doçura, a amorosidade, com as quais nos identificamos, e que, por razões igualmente misteriosas, parecem também ter desaparecido de quem nós somos. Como se nos tivessem arrancado alguém cá de dentro, sem darmos por isso, e tenham levado esse bocado arrancado para parte incerta, ficando um vazio. E por estar tão presente e activo esse vazio é fácil de perceber o vazio dos outros. Partilhamos o mesmo sofrimento da ausência dessa parte de nós, e por isso manifestamos a solidariedade que vimos na televisão. Porque sentimos que mais ninguém deveria passar por esta situação. Então porque ainda passam? Por que precisamos de ser lembrados que existe uma criança em nós que foi, outrora, levada contra sua vontade? E onde termina o ciclo? Como poderei evitar que esta dor se perpetue por mais gerações? Será que, e não tendo consciência disso, não estarei também eu a “roubar” a criança interior, a infância, a inocência, a pureza, a quem me rodeia, através dos meus pensamentos, das minhas palavras e acções?
Quanto a ti que vais seguindo este texto não sei, mas eu amo as crianças… de todas as idades. Sigo nos olhos, qual espelho da alma, as indicações que me levam ao seu encontro (da criança em cada um), e fixo-a com o meu coração. E por muito execrável que possa parecer quem está diante de mim, reconheço a sua essência pura quando a olho com o coração que não julga. Porque não há criança alguma (que todos somos) que não seja gerada por amor e com amor.
É muito difícil aceitar que tanto é criança (refiro-me não à idade, mas à essência) a Madeleine como quem a levou. Não conseguimos ainda abstrairmo-nos e não julgar. Nem olhar com amor e compreensão quem tem uma atitude tão repugnante, e que o nosso imaginário torna ainda mais relevante com pensamentos do tipo: “foi levada por isto ou por aquilo, para isto ou para aquilo…”.
Proponho um pensamento de amor para quem a levou para que possa reencontrar-se (a criança em si) e tomar consciência dos seus actos. Sigo o exemplo, na prática, de quem um dia nos disse para não julgarmos e amarmos os nossos inimigos.
Paz é agir na fé e com fé. Mesmo quando não compreendemos, nem concordamos, mas se confiarmos que assim é, assim será.

A continuar…

M.A.S.

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