segunda-feira, 23 de outubro de 2006

Estado de Paz - 6

Obrigado por trazeres a este planeta a luz e paz da tua existência. Tal como nas prateleiras do supermercado, também na vida existem prateleiras com milhões de luzes prontas, em potencial, a brilhar e a irradiar a sua energia amorosa, à espera de serem as escolhidas e montadas no seu casquilho. Mas, ao contrário do supermercado, não há luzes de primeira nem de segunda, não há luzes predilectas nem segregadas, são todas vistas de igual forma. Cada luzinha tem um brilho próprio que não é fixo, não é sempre o mesmo. Na verdade até é, mas naquilo que aceitamos como real assim não parece. As luzinhas, que todos somos, funcionam quase exactamente como as lâmpadas artificiais. Cada um de nós é uma ligação, uma conexão a uma luz maior, uma extensão da fonte de energia. Poderíamos considerar a ligação como um cabo eléctrico que, por curvas e contracurvas, leva a energia onde é preciso quando é preciso para a luz brilhar sempre. Mas então porque não brilha sempre a luz da mesma maneira? E quem disse que não brilha? Uma lâmpada se não for limpa regularmente perde o brilho? Claro que não. Apenas aparenta menor intensidade. Se sairmos à rua de óculos escuros é sinal que o sol brilha como menos intensidade? Claro que não. Apenas o aparente. Se o dia estiver nublado, o sol está a brilhar com menos intensidade? Se um candeeiro tiver um abajur mais espesso então a lâmpada está mais fraquita? Claro que não. Parece que sim, mas não verdade não. São tudo aparências. São estados relativos que, por várias condicionantes, fazem uma coisa parecer muito inferior àquela que na verdade é. Infelizmente as vidas de cada um de nós estão cheias deste “pó” invisível, de pensamentos, de emoções, de traumas, de medos, de ansiedades, de expectativas, de desilusões, de inseguranças, de tudo e mais alguma coisa, que se acumula sobre as luzinhas durante tanto tempo que elas próprias deixam de ver o seu brilho e de se reconhecer como luzinhas e pensam que são o pó. E tanto tempo lá esteve o pó que, entretanto, se moldou e tomou a forma de lâmpada e aparenta ser uma lâmpada, mas baça, fraca, incapaz de brilhar mais forte, meia-apagada, insignificante, sem importância. E então, daí em diante, quando a luzinha vê outra mais intensa, o seu maior desejo é ser como ela, com uma presença forte, reconhecida, importante, não é por acaso que se chamam estrelas a determinadas pessoas. Mas onde está a diferença de brilho entre elas senão na camada de pó que cada uma tem?

O que ainda quase todas não repararam e se repararam têm dificuldade em aceitar, sobretudo em sistema colectivos, é que cada lâmpada tem um casquilho diferente. Temos, portanto, uma fonte comum, com infinitas extensões, cada extensão tem um brilho individual mas tão intenso como a fonte que lhe dá origem, montadas num casquilho que é tamanho único para a lâmpada a que se destina, não serve para nenhuma outra, não se pode trocar nem reclamar na garantia. O casquilho é, ao mesmo tempo, o que separa a lâmpada da fonte mas também o que os liga. Cada vez que a lâmpada se queixa da pouco energia que lhe parece chegar, e que é sempre menos do que a da lâmpada vizinha, a culpa, invariavelmente, é do casquilho. O casquilho são todas as desculpas que diariamente damos para não assumirmos a limpeza dos “pós”, das poluições que acumulámos ao longo dos tempos, e que nos impedem de brilhar no máximo esplendor, irradiantes, e cuja responsabilidade tem que ser sempre de algo exterior que se torna num obstáculo. Mas como o casquilho é a nossa ligação à fonte, enquanto não assumirmos a responsabilidade da limpeza do nosso ser, por pensamento, palavras e actos amorosos e pacíficos, de acordo com a nossa essência de luzinhas, parecerá que estamos presos à vida apenas por um fio.

Paz é a capacidade de limpar tão bem o pó, mas tão bem, que vemos que afinal não há fios, nem casquilhos, e que a fonte e luzinha são um só.

A continuar…

M.A.S.

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